A região do litoral sul de Santa Catarina, nos dias de hoje, chama atenção por suas belezas naturais, principalmente pelas praias e paisagens encontradas na transição entre a planície costeira e a borda leste da Serra Geral. Pode-se dizer, em termos de cronologia geológica, que essas são paisagens relativamente novas, formadas há, aproximadamente, mil anos, e que resultam de significativas variações do nível do mar.
Estudos de geologia desenvolvidos no ambiente costeiro do sul de Santa Catarina indicam que, há acerca de 5 mil anos, toda a planície que hoje é ocupada pelo município de Tubarão, se tratava de uma grande lagoa que, possivelmente, atingia o sopé das colinas que hoje cercam a área central da cidade. As pesquisas indicam que, nesse período, o Rio Tubarão teria seu delta nas imediações da localidade do Poço Grande, abrangida atualmente pelos bairros Morrotes e São João.
Por volta de 4 mil anos atrás, com a diminuição do nível médio do mar, a curso do Rio Tubarão que hoje corta o centro da cidade, teria se formado, e seu delta estaria localizado nas imediações do encontro desse com o rio Capivari, a partir de onde teria suas ramificações distribuídas pela planície, ainda bastante inundada.
De lá para cá, mais especificamente até o início do século XX, os processos naturais de aumento e diminuição do nível do mar e da umidade em geral, foram os principais responsáveis pela formatação da geografia física local. A paisagem, por sua vez, vez sendo transformada pelas populações humanas há, pelo menos 7 mil anos, quando tem início as construções dos sambaquis, que se caracterizam na região como grandes marcadores paisagísticos e, quiçá, territoriais.
Contudo, se pretende tratar, nesta nota, de uma transformação paisagística específica, e que está associada ao crescimento urbano da cidade de Tubarão.
Recentemente, a Secretaria de Planejamento do Estado de Santa Catarina disponibilizou para download imagens aéreas sacadas em diferentes momentos da história do Estado e do Brasil, e que estão relacionadas a projetos específicos de mapeamento cartográfico do território brasileiro.
Motivada pela realização do Projeto de Avaliação de Impacto na área de implantação do Loteamento Beira Rio, no município de Tubarão, a equipe da Espaço Arqueologia solicitou acesso às imagens que compreendem a atual malha urbana da Cidade Azul, obtidas nos anos de 1957 e 1978, as quais foram imediatamente cedidas pelo órgão público.
Obter essas fotografias se tornou importante a partir do momento em que, em campo, a equipe de pesquisa foi informada pelos moradores locais que, parte da área de influência do empreendimento, compreendia ao curso natural do Rio Tubarão, área esta que hoje corresponde a uma várzea inundada. Ainda, de acordo com os moradores locais, a mudança no curso do rio foi realizada em ocasião da retificação do curso do rio, executada entre 1978 e 1985 após uma forte enchente, que assolou a cidade em 1974.
A confirmação destas informações foi constada em ambas as fotografias aéreas obtidas, as quais demonstram que, nesta altura, o Rio Tubarão possuía um curso mais sinuoso do que o atual, e que sua margem direita banhava o limite leste da área pesquisada pela Espaço Arqueologia.
Tal situação ampliou consideravelmente o grau de importância da área investigada em termos de potencial arqueológico. Conforme explica o arqueólogo Valdir Schwengber, coordenador do projeto de pesquisa, Em sua configuração natural, a área pesquisada se caracterizava como um terraço fluvial, possivelmente abrigado de inundações constantes, e situado em um ponto muito importante do curso do Rio Tubarão, que, nesta altura, sofre uma mudança de direção acentuada, que pode ser vista como um marco paisagístico. O também arqueólogo Raul Novasco, componente da equipe da pesquisa, acrescenta explicando que É comum que populações indígenas pré-coloniais, principalmente os Guarani, se assentassem em terraços fluviais às margens de rios navegáveis, como este. Dessa forma, esse poderia ser um ponto importante de conexão entre a linha de costa e o interior do litoral.
De acordo com os pesquisadores, a partir destas constatações, foram realizadas buscas intensivas nas áreas, que incluíram a escavação de poços-teste e verificações sistemáticas da superfície, no intuito de identificar indícios de ocupações pré-coloniais, contudo, nenhum vestígio foi encontrado.
No entanto, mesmo que nenhum vestígio arqueológico tenha sido encontrado, os pesquisadores chamam atenção para a importância de investigar a fundo as modificações realizadas na paisagem, seja por meio de análises cartográficas ou verificações de campo, no intuito de compreender as transformações que o espaço sofre ao longo do tempo, e quais suais implicações para a definição do potencial arqueológico dos locais pesquisados.